sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Criar dinheiro do nada

No passado dia 22 de janeiro o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mário Draghi, avançou com uma declaração inesperada para uns, mas já muito esperada por tantos outros. Na sequência de uma reavaliação exaustiva das perspetivas de evolução dos preços e do estímulo monetário alcançado, o BCE decidiu:
1) Lançar para o mercado um programa de compra de ativos - públicos e privados - EAPP. O programa prevê a compra de 60 mil milhões de euros por mês de divida pública pertencente aos países que participam no BCE. O EAPP terá início em março e durará até setembro de 2016. As compras de dívida serão feitas com base na proporção de capital de cada país no BCE. No entanto existem limites: (i) 33% sobre o total de obrigações de cada país e (ii) 25% de emissões de dívida. Saliente-se que no caso de se verificarem perdas, vigorará um sistema de partilha de perdas, através do qual o BCE assumirá 20% das eventuais perdas e os bancos centrais nacionais os restantes 80%.
2) Alterar o preço das seis operações de refinanciamento de longo-prazo específicas (Targeted longer-term refinancing operations - TLTROs), programa anterior ao EAPP. Desta forma, a taxa de juro aplicável às operações TLTRO futuras será igual à taxa das operações principais de refinanciamento do Eurosistema em vigor em cada momento, que atualmente se situa nos 0,5%.
3) Manter as taxas de juro diretoras inalteradas. A taxa de referência em 0,05%. A taxa de depósitos em -0,20% e a taxa da facilidade permanente de cedência marginal de liquidez em 0,30%.
Após se apresentarem os factos, há que tentar entender o porque deste programa de compra de ativos e qual o objetivo do BCE com esta medida, que se dá pelo nome de Expanded Asset Purchase Program (EAPP). O BCE pretende combater o risco de deflação, numa altura em que a inflação da zona euro se encontra em terreno negativo, -0,2% em dezembro segundo o Eurostat, e em que a média de 2014 rondou os 0,4%, bem longe dos desejáveis 2%. As causas apontadas para esta inflação prendem-se com desenvolvimentos geopolíticos, a taxa de câmbio e a evolução dos preços da energia.
De ressalvar que um dos principais objetivos do BCE é a estabilidade de preços e daí a necessidade destas medidas de forma a ancorar as expectativas de inflação a médio e longo prazo.
O nome técnico deste tipo de pograma é Quantitative Easing (QE), que segundo a definição do Banco de Inglaterra, consiste numa" política monetária não convencional em que um banco central cria novo dinheiro eletronicamente para comprar ativos". A teoria económica do QE resume-se aos seguintes passos:


Com este programa BCE espera que o efeito de juros mais baixos resulte em mais dinheiro disponível para investir, bem como na maior propensão para a criação de emprego, melhorias salariais e até reduções nos custos de endividamento dos estados. Paralelamente, o QE incentiva as exportações, na medida em que não deixa de ser uma emissão de moeda que desvaloriza o euro, o que desde logo potenciará as exportações dos países da moeda única para fora da Europa. Por fim, também os encargos com juros dos estados deverão cair.
Porém a aplicação deste tipo de programa também pode trazer efeitos adversos e contrários aos expectáveis. A realidade é que o impacto a curto prazo será reduzido, e em vez de potenciar a redução de impostos pode potenciar o oposto, podendo também não levar a aumentos salariais ou criação de emprego no imediato. Por outro lado, os bancos poderão voltar a fazer o que já fizeram anteriormente e em vez de reforçarem o crédito usarem os recursos para reforçarem os seus próprios capitais.
E assim se compreende que Mário Draghi alerte que “seria um erro se os governos achassem que a existência deste programa era um incentivo para expansão fiscal”, ou seja, para aumentar o endividamento. “O que esta política monetária pode fazer é criar bases para o crescimento. Mas para que a economia cresça é preciso investimento. Para haver investimento tem de haver confiança. Para haver confiança tem de haver reformas estruturais”.

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