sexta-feira, 31 de julho de 2015

As alianças estratégicas como forma de ultrapassar as barreiras à internacionalização: o caso dos consórcios






A crise económica e financeira que se arrasta há já vários anos, a integração na União Monetária Europeia e a consequente impossibilidade de desvalorização da moeda que teria como objetivo o cessar da crise, ditou o equilíbrio balança de pagamentos e a respetiva potencialização das exportações como as estratégias prioritárias a seguir. 

Contudo, são várias as dificuldades e os entraves que se colocam à internacionalização das empresas, principalmente quando se trata de pequenas e médias empresas (PME) cujos recursos são mais limitados, tendo por vezes como consequência a desistência ou o insucesso do processo de internacionalização, mesmo quando tal se subsume às exportações, as quais são consideradas a forma mais simples e menos arriscada de entrar num mercado estrangeiro e consequentemente são a principal forma de iniciar um processo de internacionalização. 

A escassez de recursos por parte das PME pode residir em diversos níveis, dos quais se destacam a escassez de recursos financeiros, produtivos, administrativos e ainda as lacunas de conhecimento ou informação sobre o potencial mercado externo (Leonidou, 2004). A Figura infra sintetiza as principais barreiras às exportações. 


 

Para fazer face às barreiras enunciadas as empresas podem optar por diferentes estratégicas, de que são exemplo a grande variedade de alianças possíveis, cuja adequabilidade variará com o tipo de barreira que a empresa pretende ultrapassar e com o nível de compromisso/risco que a empresa queira acordar/partilhar com entidades terceiras. Face à vasta tipologia de alianças existentes (com mais ou menos risco e/ou compromisso), apresentam-se de seguida uma síntese conceitual dos principais tipos de alianças e estratégias que podem ser seguidas:
  •  Cooperação informal: Visa a colaboração entre entidades sem vínculo formal. A relação entre os parceiros é distante e são pouco interdependentes;
  •  Cooperação formal: Visa a cooperação simples entre entidades, tendo por base um vínculo formal;
  •  Consórcio: Visa a associação de empresas similares, pertencentes a indústrias similares com o objetivo de partilhar ou poupar recursos, obtendo benefícios que não usufruiriam atuando individualmente;
  •  Joint Venture: Implica a associação de duas ou mais organizações com vista ao desenvolvimento de uma atividade, através da criação de uma nova entidade independente onde cada organização detém a sua quota-parte de propriedade jurídica, responsabilidade operacional, riscos e benefícios. Contudo, cada parceiro mantém a respetiva independência e autonomia individual. Este tipo de aliança visa partilhar e/ou juntar temporariamente recursos e competências diferentes e complementares dos parceiros;
  •  Outras associações dentro da cadeia de valor: Incluem formas de cooperação fortes e bastante próximas, com um elevado grau de interdependência e âmbito de atuação. Como exemplos destas formas de cooperação podem-se referir os acordos de longo prazo, dentro da cadeia de valor, entre uma organização e um fornecedor, distribuidor ou concorrente com vista à obtenção de mútuos benefícios;
  •  Acordo de distribuição: Quando uma organização coloca à disposição de outra a sua rede de distribuição, para que a última possa comercializar os seus produtos num território pré-acordado:
  •  Central de compras: Implica uma associação de empresas que pretendem minimizar os custos relativos às compras;
  •  Acordo de subcontratação: Refere-se à entrega da execução de parte do processo produtivo, a uma entidade subcontratada, mantendo a contratante a responsabilidade final sobre o produto/serviço
  •  Acordo de Investigação e Desenvolvimento: Refere-se à produção conjunta de tecnologia;
  •  Participação: Visa a aquisição por parte de uma empresa de uma posição no capital de outra;

  •  Licenciamento: Implica um acordo em que a entidade que disponibiliza a licença (licensing) garante o direito à empresa que adquire a licença (licensee) de produzir e/ou vender o produto e/ou serviço noutro país/mercado. O licensee desembolsa uma compensação pela utilização dos diretos de assistência técnica. Trata-se de uma aliança quando existe cooperação contínua entre os parceiros para melhorarem o produto/serviço;
  •  Franchising: Implica um acordo em que o franchisador concede o direito ao franchisado de explorar um determinado negócio de acordo com determinadas condições. O franchisador pode fazer-se remunerar de duas formas:
1)      Recebe uma remuneração fixa;
2)      Recebe em função dos resultados do franchisador.
A escolha pela segunda forma de remuneração pressupõem a existência de uma cooperação contínua entre franchisador e franchisado, pelo que, neste caso se pode considerar o franchising como uma aliança. 

Apesar da grande variedade de estratégias citadas, hoje pretendemos debruçar-nos sobre o caso concreto dos consórcios, que surgem como uma opção: (1) eficaz para ultrapassar barreiras relacionadas com a escassez de recursos e as lacunas de informação; e (2) pouco arriscada do ponto de vista do vínculo de longo prazo e do investimento necessário, uma vez que cada membro mantém a sua autonomia financeira, legal e administrativa. Adicionalmente, os membros podem abandonar o consórcio a qualquer momento. 

De acordo com a UNIDO (2009) o objetivo de um consórcio “é atender às intenções estratégicas das empresas-membro, proporcionando oportunidades de negócios em mercados internacionais (tanto a nível regional, como global), superando as limitações que as pequenas e médias empresas podem ter por causa do seu tamanho limitado”. É frequente que PME recorram a consórcios com o objetivo de aceder a informação ou mesmo facilitar o processo de internacionalização, pelo que é comum a existência de exportações em consórcio, sendo então definidas como “uma aliança voluntária de empresas com o objetivo de promover bens e serviços dos membros no exterior e facilitar a exportação destes produtos através de ações conjuntas” (UNIDO, 2005).

Segundo a UNIDO (2005) os consórcios de exportação são diferentes entre si e podem ser classificados através de alguns fatores, nomeadamente: 

1)      Setor a que pertencem as empresas que constituem o consórcio: podem pertencer ou não ao mesmo setor; 
 
2)      Tipo de relação entre as empresas: vertical (as diferentes empresas situam-se em diferentes elos da cadeia produtiva de um produto) ou horizontal (as diferentes empresas situam-se no mesmo elo da cadeia de valor de um produto);

3)      Localização dos membros: os membros que constituem o consórcio cingem-se à mesma região ou estão dispersos por várias regiões; 

4)      Se os bens produzidos pelos diferentes membros do consórcio são complementares ou se competem entre eles; 

5)      Duração do consórcio: podem ser de curto ou longo prazo, consoante os objetivos que os membros pretendem alcançar; 

6)      Grau de complexidade do consórcio: existem várias categorias de consórcios de exportação, começando nos mais simples que apenas prestam funções administrativas e auxiliam a comunicação e as traduções entre as partes e acabando nos mais complexos que assumem a responsabilidade de departamentos como o de vendas ou marketing, tendo, neste último caso, o consórcio uma autonomia administrativa significativa. Adicionalmente defende-se que os consórcios recém-criados devem ser simples, devendo aumentar a complexidade ao longo do tempo e à medida que a relação entre os membros se fortalece e solidifica. 

Os principais tipos de consórcios de exportação são:  
  • Consórcios promocionais: Consiste numa aliança criada para explorar mercados internacionais, facilitando a entrada dos membros nos mercados externos, promovendo os seus produtos (e.g. através de feiras internacionais) e partilhando os custos destas ações com todos os membros do consórcio;  

  • Consórcios de vendas: Consiste numa aliança criada para vender os produtos dos membros em mercado externos e promover as respetivas atividades de negócio. Note-se que no caso dos consórcios promocionais as vendas são realizadas diretamente pelas empresas associadas, inversamente ao que acontece com os consórcios de vendas.
De acordo com a UNIDO (2009) “o consórcio promocional investe os seus recursos financeiros e humanos em marketing enquanto o consórcio de vendas age como canal de distribuição e tem de investir mais, a fim de criar uma organização de vendas.”.

Não obstante, tal como todas as estratégias, os consórcios têm associados benefícios e riscos que devem ser ponderados. Oliveira (2014) sintetiza os fatores que devem ser alvo de ponderação, os quais se apresentamos de seguida, organizados em benefícios e riscos.



Benefícios associados ao consórcio de exportação:
  • Elevado grau de independência dos membros;
  • Maior flexibilidade;
  • Autonomia financeira, legal e administrativa;
  • Menor risco;
  • Fácil dissolução ou abandono;
  •  Possibilidade de prosseguir atividades internacionais paralelas individualmente;
  •  Menor investimento;
  • Redução das barreiras internas e externas à internacionalização;
  •  Expansão da rede de contactos comercias;
  • Aquisição de conhecimentos e partilha de experiências;
  •  Economias de escala;
  •  Maior facilidade em obter apoios de agentes públicos (fundos públicos);
  • Partilha de custos e risco de internacionalização;
  • Maior poder de negociação;
  •  Participação em feiras e missões internacionais de forma conjunta;
  • Possibilidade de criar uma marca própria representativa do consórcio;
  •  Maior leque de produtos, caso os membros do consórcio tenham produtos complementares;
  •  Maior capacidade de resposta a grandes encomendas, caso os membros produzam o mesmo tipo de produto;


Riscos associados a cada tipo de consórcio:  

         1)   Consórcios de exportação (em geral)

  •  Diferenças culturais com implicações ao nível das diferentes visões do modelo de negócio, valores e crenças;
  •  Disparidades de ganhos obtidos, mais concretamente no que toca à justificação das diferenças relativas aos resultados obtidos por cada empresa;
  •  Agendas secretas, ou seja a dissimulação dos verdadeiros objetivos. Algumas empresas poderão não ter qualquer pretensão de colaborar ou cooperar, apenas indagam a oportunidade de espiar as outras empresas ou algum rival direto que entrou no consórcio;
  •  Falta de espírito de cooperação e relutância em trabalhar de forma conjunta;
  •  Demasiada dependência de agentes externos;
  • Pouco empenho/dedicação/esforço;
  •  Dificuldades na redação dos estatutos, contratos ou pactos sociais ou sua revisão;
  •  Free-riding: consiste na existência de membros no consórcio que não participam nas ações conjuntas, porque preferem beneficiar do esforço dos outros, sem ter de despender quaisquer recursos financeiros;
  •  Opiniões divergentes sobre objetivos e metas.

2)      Consórcio promocional
  • Inconsistência entre a imagem e os preços dos seus produtos;
  •  Perceção dos ganhos obtidos pelo consórcio;
  •  Ganhos limitados de economias de escala.
3)      Consórcio de vendas
  •  Fraca qualidade de pelo menos um dos membros da organização;
  •  Tabela de preços praticados incoerente com a proposta de valor da aliança;
  •  Pouca variedade de produtos, quando o consórcio não tem empresas complementares;
  •  Reduzida capacidade de resposta a grandes encomendas do mesmo produto se o consórcio tiver membros demasiado heterogéneos.

Apesar dos riscos e desvantagens associados a um consórcio, alguns podem ser ultrapassados através da definição de objetivos claros e concretos e de uma análise cuidada dos “potenciais membros tendo em conta o seu tamanho, reputação, estabilidade financeira, e bens ou serviços que oferece. Estes devem ser capazes de oferecer produtos de qualidade adequada, em volume suficiente e a preços competitivos no mercado internacional.” (UNIDO,2005).




Referências
Leonidou, L.C. (2004) “An Analysis of the barriers hindering small business export development”. Journal of Small Business Management, vol. 42(3), 279-302

Oliveira, Tiago (2014) “Exportações em consórcio - Perspetivas e orientações estratégicas”. Universidade do Porto

UNIDO (2005), “Development of Clusters and Networks of SME’s: the UNIDO programme. A Guide to Export Consortia”, Vienna

UNIDO (2009), “The Strategic Management of Export Consortia: An analysis of the experience of UNIDO in Morocco, Peru, Tunisia and Uruguay”, Industrial Policy and Private Sector Development Branch





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